sábado, 12 de janeiro de 2013

Agonia de uma rua


Agonia de uma rua

Uma rua pode se parecer com uma pessoa, ou quase. Há ruas que envelhecem e morrem; outras que apenas envelhecem, e há as que sempre estão se modificando, sem nunca morrer.

Conheci uma que, mesmo já velhinha, era uma de uma beleza cativante: árvores frondosas no meio da larga rua, casas tão antigas quanto a rua enfeitando a paisagem, e, mesmo com o numeroso fluxo de pessoa, carros, e o ensurdecedor barulho dos ônibus, acompanhados da baforada de fumaça que eles deixavam, aquela rua era bonita.

Aos poucos, para nosso desgosto, foram surgindo buracos na paisagem feita pelas casas centenárias. Esses buracos, onde havia sido uma casa, iam fazendo da rua uma espécie de boca, banguela, sem os lindos dentes que se abriam em vários quarteirões de sorrisos.

Com o tempo, os buracos foram aumentando. Ou surgiram moradias feias, que já nasceram mal tratadas ou batizadas pelo mau gosto.

A rua não morreu, mas, parece estar em coma.
Onde havia a casa que eu tanto amava, hoje, há um hediondo buraco.

Evito passar ali e, quando passo, não olho para os lados. Não reconheço mais nada, e nem quero reconhecer. Em minha mente, tudo está em seu perfeito lugar.

- “Essa rua já teve os seus encantos.”, disse uma tia minha. Sua frase, carregada de um suspiro emocionado e de saudosas lembranças ainda ecoa em meus ouvidos e sua expressão, olhando a rua e ao mesmo tempo o passado, está gravada em minha memória.

Nessa época, não lembro bem, creio que minha avó tinha acabado de falecer e no ano seguinte minha tia partiria. Pouco tempo depois, seria eu mesmo quem repetiria a mesma frase, com a mesma expressão, sentimento e olhar perdido em minhas lembranças.

E, ainda hoje, eu repito:
- “Essa rua já teve os seus encantos.”.


Marcelo Bonavides, Fortaleza, 12 de janeiro de 2012.

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